MEUS FILMES FAVORITOS DE 2022

Lista, textos e capa de Diego Quaglia.

"Uai, a gente dá um jeito" - "Marte Um" (2022)

Um ano de grandes vivências, de retorno, novos horizontes para o futuro, novos projetos, alegrias, sentimentos conflitantes e um Brasil liberto do monstro que nos assombrava. Como acho que o cinema está sempre ligado diretamente com os afetos que passamos muito obrigado a cada uma das pessoas que compartilharam dessas experiencias comigo e fizeram esse 2022 ser tão especial. Muito obrigado a todos que trouxeram apoio e alegrias. Antes da lista de filmes vamos falar de outras coisinhas.

As atuações do ano que mais me impressionaram, encantaram e mexeram comigo:

Atrizes Favoritas:

1.    Léa Seydoux, “One Fine Morning” (“Un beau matin”)

2.    Margaret Qualley, “Stars At Noon” (Claire Denis)

3.    Rejane Faria, “Marte Um”

4.    Anna Cobb, “We’re All Going to the World’s Fair”

5.    Frankie Corio, “Aftersun”

6.    Cate Blanchett, “Tár”

7.    Juliette Binoche, “Com Amor e Fúria” (“Avec amour et acharnement”)

8.    Keke Palmer, “Não! Não Olhe!” (“Nope”)

9.    Taylor Russell, “Até os Ossos” (“Bones and All”)

10.  Sheri Moon Zombie, “Os Monstros” (“The Munsters”) 

Atores Favoritos:

1.    Jack Lowden, “Benção” (“Benediction”)

2.    Jon Hamm, “Confess, Fletch”

3.    Banks Repeta, “Armageddon Time”

4.    Paul Mescal, “Aftersun”

5.    Carlos Francisco, “Marte Um”

6.    Gabriel LaBelle, “Os Fabelmans” (“The Fabelmans”)

8.    Daniel Kaluuya, "Não! Não Olhe!" ("Nope")

9.    Vincent Lindon, “Com Amor e Fúria” (“Avec amour et acharnement”)


10.  Colin Farrell, “Os Banshees de Inisherin" ("The Banshees of Inisherin")


Atrizes Coadjuvantes Favoritas:

1.    Fabrizio Gifuni, “Noite Exterior – Partes 1 e 2” (“Esterno Notte 1 e 2”)

2.    Toni Servillo, “Noite Exterior – Partes 1 e 2” (“Esterno Notte 1 e 2”)

3.    David Bradley, “Pinóquio por Guillhermo del Toro” (“Guillermo del Toro’s Pinocchio”)

4.    Steven Yeun, “Não! Não Olhe!” (“Nope”)

5.    Peter Capaldi, “Benção” (“Benediction”)

6.    Michael Wincott, “Não! Não Olhe!” (“Nope”)

7.    Paul Dano, “Os Fabelmans” (“The Fabelmans”)

8.    Barry Keoghan, “Os Banshees de Inisherin” (“The Banshees of Inisherin”)

9.    Anthony Hopkins, “Armageddon Time”

10.  Brendan Gleeson, “Os Banshees de Inisherin” (“The Banshees of Inisherin”)

Atrizes Coadjuvantes Favoritas:

1.    Margherita Buy, “Noite Exterior – Partes 1 e 2” (“Esterno Notte 1 e 2”)

2.    Kristen Stewart, “Crimes do Futuro” (“Crimes of the Future”, David Cronenberg)

3.    Kerry Condon, “Os Banshees de Inisherin” (“The Banshees of Inisherin”)

4.    Daniela Marra, “Noite Exterior – Partes 1 e 2” (“Esterno Notte 1 e 2”)

5.    Brittany Snow, “X”

6.    Rachel Sennott, “Morte Morte Morte” (“Bodies Bodies Bodies”)

7.    Angela Bassett, “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” (“Black Panther: Wakanda Forever)

8.    Michelle Williams, “Os Fabelmans” (“The Fabelmans”)

9.    Sigourney Weaver, “Avatar: O Caminho da Água” (“Avatar: The Way of Water”, James Cameron)

10.  Marcia Gay Harden, “Confess, Fletch”

20 cenas do ano que mais me impressionaram, encantaram e mexeram comigo:

1.    Olhando o céu, "Marte Um"

2.    "Under Preassure" e o plano final, "Aftersun"

3.    A destruição final, "The Fire Within: Requiem for Katia and Maurice Krafft"

4.    O choro/a cena na igreja, "Benediction"

5.    A perseguição, "Nope"

6.    A confissão, "Esterno Notte"

7.    JOHN FORD/a descoberta pelo filme, “The Fabelmans”

8.    Luta na festa, "RRR"

9.    VAL KILMER, "Top Gun: Maverick"

10.  A tentativa da venda, "Armageddon Time"

11.  A operação de Breken, "Crimes of the Future"

12.  A aparição do tulkun, “Avatar”

13.  Herman e Lily namorando, “The Munsters”

14.  O poder da câmera, "O Filme da Escritora"

15.  O final, “Ambulance”

16.  O metrô, “One Fine Morning”

17.  A perseguição ao Pinguim, “The Batman”

18.  A boate, “Stars At Noon”

19.  O reencontro, “Bones and All”

20.  O plano final, "Dark Glasses"

Eis finalmente a lista dos filmes favoritos lançados em 2022:

30.  “Era Uma Vez um Gênio” (“Three Thousand Years of Longing”, George Miller)

Singelo e econômico em todo o seu uso fervente de fantasia. O que cria um contraste de um filme que é bem expansivo nas suas aparências, mas mínimo no que realmente faz. Toda a imaginação do mundo é para cobrir duas pessoas e os relatos que surgem entre elas. Dividir algo é formar um laço e para cobrir o surgimento de uma relação, existe essa imaginação que acaba por aprofundar esses efeitos. Disponível em locação digital.

29. “Adeus, Capitão” (Vincent Carelli e Tatiana Soares de Almeida)

Triste nação.

28. “Occhiali Neri” (Dario Argento)

Um filme surpreendente do Argento. Ele – de todas as pessoas – brincando com o mais próximo que ele possa e queira chegar de uma sobriedade narrativa (a primeira parte e tudo que envolve os personagens centrais é quase um melodrama Argentiano guardadas as devidas proporções), mas não esquecendo o seu senso de estilo e de caricatura de sempre. E percebendo feridas eternas que o terror é capaz de deixar pra trás: marcas físicas irreparáveis, a solidão e misoginia do mundo a sua volta, pessoas indefesas e traumas que ficarão para sempre. E é esse flerte com a sobriedade da primeira parte que vai levando ao pânico e intensidade da perseguição e do grafismo na segunda. No final das contas é um filme sobre encontrar paz, acolhimento e companheirismo no meio do terror, mas a melancolia da solidão pode seguir para sempre.

27. “Até os Ossos” (“Bones and All”, Luca Guadagnino)

A metáfora do canibalismo como um reflexo das complexidades sentimentais e psicológicas do mundo jovem e o amor juvenil, o talento de Taylor Rusell e o cuidado com as regiões por onde passa fazem com que os vícios de Guadagnino – cineasta que eu geralmente gosto, mas poucas vezes me importo intensamente – estejam mais sob controle e os seus talentos estejam em um estágio de maior interesse.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/11/06/critica-ate-os-ossos-46a-mostra-de-sao-paulo/ 

26. “Dead for a Dollar” (Walter Hill)

A concisão dramática de um mestre dedicado ao cinema de gênero.

Texto completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/dead-for-a-dollar/

25. “Com Amor e Fúria” (“Avec amour et acharnement”, Claire Denis)

A dúvida e o sufoco da aniquilação do amor. É natural que um cinema tão intenso quanto de Denis se encontre alguma vez no melodrama. Seus planos tão sufocantes e ardentes dão gás pra Juliette Binoche e Vincent Lindon que estão excelentes.

24. “Stars At Noon” (Claire Denis)

Nicarágua, meu amor. O mundo parece um lugar onde a desilusão salta em cada ponto, diante disso, o que resta além de se entregar para a paixão quando a faísca dela é apontada? Denis uma detalhista dos rostos, dos corpos e das sensações dentro de um mundo que compõe uma atmosfera da confusão e de prisão. A atenção que o filme dá para a Margaret Qualley é hipnotizante. Uma das grandes atuações recentes.

23. “Confess, Fletch” (Greg Mottola)

Mottola, herdeiro de cineastas como Leo McCarey, James L. Brooks, Howard Hawks e Peter Bogdanovich, é facilmente para mim o melhor diretor de comédia no cinema estadunidense mainstream pós–Irmãos Farrelly. Seu domínio de cinema clássico é tão formidável quanto a atenção, carisma e fascínio apaixonado que dá para os seus personagens, não importando o quão patéticos eles sejam e o quão ele goste de debochar disso com muito afeto, algum carinho e muita ironia. Ele usa as suas habilidades classicistas aqui para elaborar uma comédia de investigação que mescla o neo–noir com uma screwball comedy cheia de tipos curiosíssimos feitos por atores todos muito inspirados. Um Jon Hamm maravilhoso comanda tudo isso de forma hilária como esse malandro idiota que dá o espírito para a obra e faz com que ela toda se construa em cima da sua personalidade cênica. A criação estilosa do filme, o carisma dos envolvidos, o texto cheio de trocas afiadas, as piadas das situações malucas, o timing, a direção de atores e o aproveitamento de mesclar um aspecto narrativo/estético da televisão contemporânea desse gênero (como um “Only Muders in the Building”) com esse domínio de cinema clássico criam uma experiencia extremamente divertida. Uma pena que provavelmente não veremos mais aventuras de Fletch interpretado por Hamm e dirigido por Motttola. Uma pena que ele não faça mais filmes e não seja visto como o diretor talentoso que é. E uma pena que o melhor da comédia estadunidense e filme de médio orçamento de gêneros variados estão quase faz mais relegados e pasteurizados. Por mais Mottola.

22. “Os Monstros” (“The Munsters”, Rob Zombie)

Um filme sobre a relação de consumo e feitura. Uma declaração de amor a Rob Zombie a tudo que ele ama e uma celebração do humor bobo e barato de melhor qualidade. O divertimento dos envolvidos salta para fora.

Comentário completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/the-munsters/

21. “Racionais: Das Ruas de São Paulo Pro Mundo” (Juliana Vicente)

“A revolução vai vir de baixo, da raiz, da lama”. Disponível na Netflix.

20. “Tár” (Todd Field)

A arte e as suas várias teias.

Texto completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/tar-2022/ 

19. “Batman” (“The Batman”, Matt Reeves)

Reeves segue se mostrando um cineasta extremamente talentoso em se apropriar de marcas de grandes franquias para estabelecer os seus estudos de personagem altamente densos em questão de psicologia e política. Não seria exagero dizer que o “Batman” de Robert Pattinson aqui nesse filme é um irmão do Caesar dos filmes que ele fez da franquia “Planeta dos Macacos”, com uma abordagem bastante similar, e que o que antes era um palco para que Reeves “brincasse” com as relações emocionais e psicológicas entre grupos de macacos e humanos em filmes de guerra sufocantes, políticos e duros, se torna uma oportunidade de ele examinar e traduzir em visual e narrativa esse seu Batman numa epopeia urbana estilizada e sombria com os seus próprios interesses políticos de crítica. Colocando na obra o seu já visto talento para o trágico, para o tom sufocante, para a internalização do sofrimento de seus personagens, para as transposições de gêneros, para a criação de cenas de ação, para o olhar transmitido na câmera e decupagem e para o tormento mental que ele já havia demonstrado e com ainda mais ambição. Na minha cabeça é o que os filmes do Nolan tentam ser por um cineasta que tem uma compreensão de ação, estilização, política, psicologia, relacionamento entre personagens e ambição na sua seriedade – sempre quebrada pelo sarcasmo natural e bem–vindo das situações como a cena do Pinguim – que é muito mais interessante para mim. Muito mais executada de fato do que apenas declarada. Disponível na HBO Max.

Texto completo em:

https://cineplot.com.br/a-dramaturgia-da-tragedia-em-the-batman-2022-de-matt-reeves/ 

18. “One Fine Morning” (“Un beau matin”, Mia Hansen–Løve)

Um conhecimento pleno de como extrair o cotidiano e tirar as energias dele com leveza, liberdade e dramaticidade. Mia e uma perfeita Léa Seydoux – a cada ano se mostrando uma das grandes atrizes que temos – totalmente entrosadas.

17. “Avatar: O Caminho da Água” (“Avatar: The Way of Water”, James Cameron)

Um filme sobre a pureza das relações, das emoções e das imagens. A fé inabalável na família. A fé inabalável nas suas paixões, no que é clássico e no que você acredita.

Texto completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/avatar-the-way-of-water/#comment-16165537

16. “Ambulância – Um Dia de Crime” (“Ambulance”, Michael Bay)

Como muitos já disseram é o mais próximo que o Bay chegou do Tony Scott e talvez o mais próximo que chegará. Um cinema de criação máxima de energia e que te seduz totalmente com ela. Disponível no TelecinePlay da Globoplay e em locação digital.

Vídeo sobre em:

https://www.youtube.com/watch?v=GWT9DM3ehkM 

15. “We’re All Going to the World’s Fair” (Jane Schoenbrun)

Viver com nós mesmos por si só uma coisa muito assustadora, não é? Muito poderoso em destacar a nossa relação com o consumo de mídia e em como isso funciona emocionalmente. Só pela posição em como assistimos algo, o tempo que isso é prologando e as diferentes telas sentimentos diversos são muito percebidos. Me lembrou muitas sensações que eu tenho com o cinema do Gus Van Sant e do James Benning.

14. “Pinóquio por Guillhermo del Toro” (“Guillermo del Toro’s Pinocchio”, Guillhermo Del Toro e Mark Gustafson)

Um manifesto sobre amar a imperfeição, viver e vencer ela, amar o outro como o outro é, pensar por si mesmo, questionar o mundo a sua volta e enfrentar o fascismo. As melhores qualidades do Del Toro no mesmo filme. Lindíssimo. Disponível na Netflix.

Texto completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/guillermo-del-toros-pinocchio/

13. “Top Gun: Maverick” (Joseph Kosinski)

O último rebelde continua vibrando e fervendo intensamente. Disponível na Paramount+.

Texto completo em:

https://cineplot.com.br/top-gun-maverick-2022-de-joseph-kosinski/

12.    “O Filme da Escritora” (“Soseolgaui Yeonghwa”, Hong Sang–soo)

Mais um filme sobre o fascínio inabalável pela arte se misturando com a vida cotidiana. Hong Sang Soo mistura esse senso de locomoção constante que a vida tem, os seus passeios, as passagens por diferentes lugares, diferentes passeios dentro da mesma caminhada, diferentes interações, associações com diferentes pessoas e os sentimentos extraídos com uma conversa com elas com a experiência do próprio cinema. Por que isso é tão fascinante? Tão bonito? Porque estamos lidando com um dos maiores gênios em atividade da sua área.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/10/29/critica-o-filme-da-escritora-46a-mostra-de-sao-paulo/

     11. “Skinamarink” (Kyle Edward Ball)

O terror de uma casa vazia. De passear pelos cômodos. Da estar fechado na noite. De só ter a companhia dos televisores. Eu acredito que há mais coisas entre o cinema experimental e o cinema de terror do que pode imaginar nossa vã filosofia.

10. “Os Fabelmans” (“The Fabelmans”, Steven Spielberg)

It's a Wonderful Life. O estranho poder do cinema. Com “Os Fabelmans” e “West Side Story” dá para dizer que Spielberg, o nosso Frank Capra contemporâneo, recuperou a paixão por filmar que parecia desaparecida em seus projetos anteriores mais recentes. Aqui o diretor mais doce da Nova Hollywood faz um filme sobre ter controle das imagens ao mesmo tempo que se escapa do controle da vida. Um filme sobre esse controle emocional das imagens se fundido com as nossas realidades. É um filme que se apoia nesse seu formalismo detalhista e no seu preciosismo técnico para destacar o que ele faz de melhor: usar isso como um reflexo de sonhos – os bons e os ruins – de uma mente ainda presa em uma infância cheia de dualidades. Ele passeia com naturalidade pela ternura das dinâmicas familiares que são extremamente genuínas, assim como investiga questões densas emocionais e psicológicas que se encontram com o convívio familiar – com as suas falhas – que varia entre o encantador e o pesado. A paixão pelo cinema além de fascínio e amor que enfeitiça à primeira vista ao ver mundos se formando a partir de imagens é tanto uma forma de estender o amor pela sua família, unir a coletividade do mundo real para fazer a fantasia, se rebelar, fugir para outro mundo longe dos conflitos, tristezas, dificuldades, seus piores e melhores momentos, a violência antissemita, reviver sentimentos das nossas vidas e comandar imagens que você tem um pouco de controle, diferente do mundo real, mas esse controle também pode ganhar vida própria e revelar os sentimentos mais ocultos. O cinema é tudo isso e ao mesmo tempo não é nada já que é uma essência invisível que enfeitiça e apaixona. E a sequência do John Ford é um negócio foda e lindo demais.

Texto completo em:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/the-fabelmans/

09. “Armageddon Time” (James Gray)

James Gray decide narrar e encenar a mente infantil. Uma mente ainda em construção, em descoberta e em desenvolvimento. Muitos filmes já falaram sobre crianças e suas jornadas durante a infância, mas poucos são os que realmente conseguem materializar como cinema o funcionamento de uma mente infantil na sua essência. Aqui Gray de fato mergulha nisso sem concessões. É um filme que enxerga, narra e filma tudo totalmente colocado com o olhar do seu protagonista. Uma criança que tem que enfrentar e vivenciar questões que ela está aprendendo a compreender e não tem noção completa até a sua desilusão final: os pais progressistas que acabam reforçando preconceitos que eles mesmos criticam, o avô que antes era só uma figura doce de proteção lhe revela a dura realidade de como enfrentar seus problemas, questões raciais e de classe que ele enxerga superficialmente por não estarem ligadas a ele, a sua noção torta de quem ele mesmo é, seu privilegio branco, testemunhar o horror que é o mundo para aqueles que não são privilegiados e não poder fazer nada e ascensão de uma extrema–direita saída dos arredores mais reacionários da burguesia. É um filme de um homem branco de classe média confessando as suas culpas, mas não vejo isso como um demérito, exatamente porque é muito honesto sobre todos os defeitos e limitações que a versão infantil do próprio diretor tem. Afinal Gray sabe que nunca vai alcançar o racismo ou os sentimentos do amigo negro do seu protagonista pela perspectiva de uma pessoa negra, e por isso filma e narra as suas cenas como apenas uma testemunha, um espectador e um ouvinte, enquanto está totalmente inserido no olhar de sua versão infantil, justamente por isso é até corajoso que o protagonista seja uma criança longe de idealizações, heroísmos, romantismo, cheia de defeitos, chato e de fato até bem antipática em diversas questões, como várias outras crianças que cruzamos por aí são, que erram ao viver a vida e não estão nos comerciais de TV.

Os filmes de Gray tem essa beleza de não esconder a imperfeição do ser humano nesses mergulhos no lado mais sombrio de viver. Por isso vejo com tanta honestidade esse filme sobre estar numa situação de privilégio, ser colocado nela e testemunhar um horror que você não tem noção. E quanto começa a ter já é tarde demais. O que lhe resta é continuar andando pela calçada e pensar em não cometer mais esse mesmo erro no futuro. O jovem Banks Repete é brilhante em extrair isso e é de uma expressividade arrasadora.

 De certa forma esse filme lembra o “Infiltrando na Klan” em refletir o passado da América de Reagan para tratar do inferno deixado pela América de Trump, como se tudo fosse um ciclo de horror de sementes que são plantadas lá atrás e florescem no futuro quando outras árvores caem, porém ao mesmo tempo seu tom parece muito mais de um melodrama típico de um cinema de Sidney Lumet ou de Robert Mulligan com esse minimalismo trágico de Gray, e é simplesmente deslumbrante como o diretor e o seu fotografo já habitual Darius Khondji criam essa ideia de um passado sombrio, de cores secas e anti–nostálgico se combatendo constantemente com os sentimentos de sonho que são típicos de qualquer criança. É um filme sobre essa eterna das tristes descobertas durante a infância e sobre as formas de visualizar ela. Alguns pequenos detalhes de encenação como um movimento de câmera lentamente chegando até um plano detalhe num objeto da NASA deixado pelo amigo do protagonista ou as costumeiras capturadas em vidros destacam porque Gray é um cineasta raro nos dias de hoje.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/10/18/critica-armageddon-time-46a-mostra-de-sao-paulo/

08. “Crimes do Futuro” (“Crimes of the Future”, David Cronenberg)

Belo e carnal. Vivenciar dores revividas e atuais é sentir o mundo na verdade. A intensidade do corpo sendo cortado num universo minimalista. Os movimentos intensos de uma mordida, da performance, de um corte, dos corpos, do que é plástico, da cirurgia, de um mundo em ruínas e dos debates e teses sobre dor e prazer, arte, vida e humanidade. Tudo é mínimo, mas tudo tem um efeito carnal em sua máxima intensidade. Como no final a maravilhosa expressão de Viggo Mortensen reafirmo sobre como esse é um filme em que o "sentir" é levado ao máximo. Disponível na MUBI.

Texto sobre o filme:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/crimes-of-the-future-2022/

Vídeo sobre o filme:

https://www.youtube.com/watch?v=hzib93W039M 

07. “RRR: Revolta, Rebelião, Revolução” (“RRR”, S. S. Rajamouli) 

O filme perfeito. Para todo mundo que ama a excelência da encenação de ação levada ao máximo, de coreografias de dança hipnotizantes, das amizades improváveis que se mostram prováveis, do melodrama romântico de amores impossíveis e separados, da força do épico misturado com a potencialidade da fantasia e colonizadores imperialistas sendo humilhados pela revolução, esse filme é um deleite completo. Disponível na Netflix.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/10/18/critica-armageddon-time-46a-mostra-de-sao-paulo/

06. “Noite Exterior – Partes 1 e 2” (“Esterno Notte 1 e 2”, Marco Bellocchio)

A história política de um país às vezes pode ser um grande cemitério, uma mansão mal-assombrada, e os fantasmas são aquelas cicatrizes marcadas e analisadas pela força do tempo. A obra de Bellocchio continua não se interessando por idealizações, e sim por olhar o que ficou para trás para entender o presente, não escondendo os seus fracassos e todo os olhares que a cercam. Seu traquejo épico para transmitir esse grande funeral de vidas marcadas e destruídas pelo cenário político – ao invés de celebrar algo – e a sua habilidade sem igual com diversos atores espetaculares é algo formidável.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/11/07/critica-noite-exterior-46a-mostra-de-sao-paulo/

05. “Aftersun” (Charlotte Lewis)

Abraçar os afetos e viver os vácuos. Um abraço que você nunca quer que acabe. Imagens vão se multiplicando uma em cima da outra, vindas de lugares diferentes e com apelos diferentes. Lembranças se misturam dentro de uma viagem que segue e que não vai poder durar para sempre. Enquanto o pai (um Paul Mescal sensacional) vive com uma dor oculta e internalizada, a filha lida com os horizontes disso se descobrindo numa fase complexa onde a criança começa a se atrair e viver um mundo que ainda não é dela, mas muito logo será. O jeito que a decupagem da Charlotte Lewis e a montagem passeiam por esses dois personagens e a aproximação deles realmente rende momentos de uma explosão de emoção acompanhada pelo som. Como no final. Que pode explodir em música ou só no silêncio. Chega na MUBI em Janeiro de 2023.

Comentário:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/aftersun/

Texto completo:

https://cinemacao.com/2022/11/08/critica-aftersun-46a-mostra-de-sao-paulo/

04. “Não! Não Olhe!” (“Nope”, Jordan Peele)

Um filme sobre o registro. Jordan Peele faz um filme que gira todo em torno sobre registrar o que é “incompreensível” para a maioria: seja aqui ou lá fora. O funcionamento dos animais, da vastidão do universo, dos invasores de outros lugares, tudo se mistura e poucos são os que conseguem entender isso para que em imagens esses fatores sejam capturados e fiquem eternizados. Peele leva um bom tempo apenas construindo um contato de proximidade com aqueles capazes desse registro e quando finalmente esse contato é costurado e a “incompreensão” aparece no céu os seus planos abertos, a movimentação de câmera acompanhando os cenários aéreos, as câmeras subjetivas, toda a construção da ambientação dos ataques e dos seres – a terra, os efeitos, os objetos de cena, a direção de arte dentro e fora de tudo isso e de como isso tudo anda com essa fotografia especifica – que o filme registra se manifestam num festival de tensão e beleza em sequencias que são de tirar o folego. Cada um dos agentes desse registro funciona perfeitamente seja Daniel Kaluuya como o vaqueiro perfeito, sua simetria de contrates e afetos com a sua irmã em tela Keke Palmer e a voz de Michael Wincott algo por si só abençoado. Com essa materialização do que é o registro de algo tão distante de ser percebido já que é algo que foge do funcionamento da gente como seres, Peele entrega ainda todo o seu fascínio bem-humorado por questões diversas da cultura pop no que é o seu filme mais frontal. E o resultado é grandioso tal qual os momentos que esses ataques vão se manifestando. Disponível em locação digital.

Vídeo sobre o filme:

https://www.youtube.com/watch?v=1djL1LeasGs 

03. “Fogo Interior: um réquiem para Katia e Maurice Krafft” (“The Fire Within: A Requiem for Katia and Maurice Krafft”, Werner Herzog)

O apocalipse que está entre nós. Que está diante de nós. Imagens deslumbrantes. Uma viagem pela lava, pelo fogo, pela lama, pela fumaça, pela água, pela natureza e pela ciência que é percebida e extraída em imagens e em música enquanto investiga as destruições e as ruinas deixadas na nossa sociedade. O que começa como um deslumbramento termina como um alerta. Uma ópera das imagens.

02. “Marte Um” (Gabriel Martins)

Vencemos.

Comentário sobre o filme:

https://letterboxd.com/diegoquaglia/film/mars-one/1/

Vídeo sobre:

https://www.youtube.com/watch?v=W7y4DkSbUNs 

01.  “Benção” (“Benediction”, Terence Davies)

Filme que me destruiu totalmente justamente pela habilidade em conseguir fazer com que a encenação, a maneira de filmar, a montagem e o seu texto transmitam sentimentos com tanta clareza e de um jeito tão pulsante. É uma dessas obras que parecem tão gigantes, tão além, que qualquer coisa que for dita sobre ela não vai fazer jus. Sai muito tonto com o impacto da sessão em que o vi na Mostra de São Paulo. Com o jeito que o Davies cria um impacto tão profundo com coisas simples como a câmera se movendo e se aproximando lentamente mudando cenários, tempos e faces. Pela forma que ele lida com os seus diálogos incríveis que são cheios de graça e uma certa leveza, o que só deixa ainda mais evidente uma melancolia muito grande quando ela aparece construída em palavras que os atores falam com tanta naturalidade e paixão por cada letra. Ele é um verdadeiro poeta do cinema em casar esse lirismo visual e textual com a dureza do mundo. Em fazer imagem e texto andarem juntos. Tudo isso é colocado nos ombros um excelente Peter Capaldi nos seus poucos momentos em tela e de um extraordinário Jack Lowden, carregando totalmente o tom do filme de maneira fascinante e melancólica. Como é prazeroso ver o cinema sendo colocado no seu máximo.

Texto completo em:

https://cinemacao.com/2022/11/06/critica-bencao-46a-mostra-de-sao-paulo/ 

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