OLHAR DE CINEMA 2020: “CABEÇA DE NÊGO”: OCUPAR (DÉO CARDOSO, 2020) | CRÍTICA
Capa de Cid Souza.
Abrir os olhos do mundo que você está e não largar a
mão. Resistir, se unir e não sair da sala. Ocupar. Ocupação do jovem preto. Do
jovem militante ao sistema. "Sorrisos e lágrimas" do jovem que não
sai mais.
Não é todo filme do cinema brasileiro contemporâneo que
consegue casar tão bem o poder da sua mensagem política, social e racial com a
sua força cinematográfica como “Cabeça de Nêgo”, primeiro longa–metragem de Déo
Cardoso. Existe uma preocupação tão grande de te envolver junto com Saulo, o
protagonista, com aquele ambiente escolar, com os corredores, as rodas de
alunos, seus conflitos, com aquelas figuras e suas interações, com aquele
microcosmo escolar que a gente vai vendo se formar aos poucos com suavidade e
um teor cartunesco proposital – quase que num encontro curioso do pop clipeiro jovem
desde os créditos iniciais com uma contundência muito típica do cinema
brasileiro independente – até que ele exploda de forma muito violenta, muito
mesmo e meio que te faça se envolver junto com Saulo assim como ele está
envolvida pela descoberta do engajamento político e descoberta racial que é
muito magistral.
Magistral porque consegue somar o domínio de sua
mensagem com um domínio de direção bem hipnotizante mesmo fazendo que a coisa
parta muito além de uma verborragia ou de um texto, pelo contrário, ganha força
por ele: o filme tem um fluxo solto de inserções de imagens na montagem, o
casamento entre ficção e imagens de arquivo e reais de cunho político, de uma
câmera pulsante que vibra pelos cenários, uma atmosfera de rap não só na trilha
sonora e uma verdadeira paixão pelos personagens, pela união política que se
forma entre eles, pelo o que filma e conta ao mesmo tempo que uma potência
dramática muito violenta em toda a coreografia de quando a sua crítica que
vinha desenvolvendo explode. Ao ser vítima de racismo e acabar injustiçado numa
aula, Saulo decidi ocupar a sua escola e não sair de lá. A ocupação vai
escalando, envolvendo outros alunos, tomando conta da mídia e aí onde vemos nessa
explosão o lado mais asqueroso e violento do Brasil: dos poderosos, do
funcionamento da nossa educação, da polícia militar e de todos que administram
um poder branco e repressor. Um poder que abusa daqueles que aprendem e
daqueles que verdadeiramente ensinam (aqui tendo voz pela personagem de Jéssica Ellen, ótima atriz, funcionando
muito bem como um ele propositalmente deslocado de todo aquele resto).
Enquanto isso o filme também é excecional em entender
o poder do aprendizado e da formação do jovem preto na era moderna. Era dos que
nasceram nos tempos da Internet. A câmera numa cena passeia por escritos dos
alunos na sala dando uma volta enquanto o jovem Saulo lê, ela observa as frases
de militância, as besteiras daqueles jovens, ela observa um código de união
entre todos eles que aparece até nas palavras. Nos seus dizeres. No seu modo de
falar. Numa cena parecida os dizeres da militância estão marcados nas mesas
enquanto a câmera as percorre. Em outro momento, Saulo lê na sala, sozinho, de
noite, aprendendo mais e mais sobre a sua luta, inserções de imagens das lutas
e ícones da história preta aparecem atrás dele pela montagem ao som de “Sorrisos
e Lágrimas” do Emicida, é a força dos códigos de união militante que andam
juntos.
Códigos sobre união estudantil. Ocupação. Em outro
momento num close fechado no rosto suado de Saulo, se recusando a sair da sua
sala de aula após sofrer racismo e ser culpado pelo ato, vamos de modo
desfocado a imagem do seu agressor ao fundo atrás dele. A dor confusa e triste de
uma agressão racista assim como a posição do diretor aparece na filmagem: Saulo
é mantido visibilizado, em foco, enquanto aqueles que o agridem ocupam o espaço
que ele sofre naquele espaço: de ser “o invisível”. É comum eu me incomodar com
retratos de cenas de racismo em filmes e em como os personagens reagem a elas,
em “Cabeça de Nêgo” eu acho que vi um dos exemplos mais precisos de filmar um
momento assim. O texto que cai em alguns momentos no explicativo e expositivo não
me incomoda porque tudo é filmado com tanta paixão, tanto agressividade, que é
como se estivéssemos vendo um desabafo que serve como uma liberação e não como
um textão de rede social que é onde alguns filmes com as mesmas intenções caem.
Ao final depois de toda a emoção, impacto e imersão que o filme oferece, quando
aparece um “dedicado a Adélia Sampaio e Zózimo Bulbul” o único resultado foi um
sorriso choroso no meu rosto. Muito parecido com o entusiasmo que Saulo
conversa sobre os Panteras com a sua professora. Palmas.
“Me fala qual é o seu Pantera predileto?”.
“A maioria é massa, mas eu gosto demais do Freddie
Hampton”.
“É. O Freddie era massa, né?”.
“E qual é o da senhora?”.
“O meu? Na verdade, é a minha. É a Ericka Huggins”.
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