"THE END OF EVANGELION: RESPOSTAS?” (HIDEAKI ANNO E KAZUYA TSURUMAKI, 1997)

Crítica escrita por Diego Quaglia

Capa por Cid Souza

“É um ciclo sem fim”.

Está aí um filme que fala sobre respostas sem recorrer a elas. Os conflitos da mente de Shinji brilhantemente encenados no magistral final de “Neon Genesis Evangelion” (1995–1996) ganham um corpo muito físico e carnal em “The End of Evangelion”. Hideaki Anno e Kazuka Tsurumaki dividem o filme em duas partes que acompanham um dos mesmos pontos temáticos do final da série: somos nossos piores inimigos, seres autodestrutivos e precisamos confrontar os nossos piores lados ocultos, mas pulsantes em nossas mentes.

A primeira parte então reverbera essa batalha da humanidade com ela mesma de forma direta e violenta. Os personagens respondem uns aos outros com violência. Desde a primeira cena do filme. O que começa com um abuso vai escalonando pra execuções, mortes, bombas e uma verdadeira carnificina. Os cortes rápidos e uma ação bem visceral vão marcando momentos bem memoráveis onde os destinos dos nossos personagens são marcados por essa violência que arrasa tudo e todos internamente e externamente. É muito dolorosa. Outra resposta que personagens recorrem é o sexo que trabalha junto com a violência de certa maneira também explicitando ainda mais a relação de Shinji com as mulheres da sua vida: Rei, Asuka, Misato e até a sua mãe (afinal como todos Shinji é fruto dessa “maldição” paterna/materna que não deixa de cerca–ló), e também o homem da sua vida: Kaworu Nagisa.

O sexo aqui funciona como um estimulo ou uma fantasia das descobertas e desejos da idade (como na cena final entre Shinji e Misato), mas também como respostas violentas das duas partes, do pior de uma relação, de duas pessoas que se machucam e como algo que salienta o posso sem fundo de contradições de relações emocionais tão toxicas e profundas como fica claro nas cenas envolvendo Shinji e Asuka, meio que o foco primordial do filme. É algo muito triste de se assistir. É a destruição. É também Asuka, o grande destaque da primeira parte, o centro da violência. Seu grande momento é respondendo como ela sabe: com brutalidade, raiva, com sangue, com catarse, ao mesmo tempo lutando como sempre lutou e agora com a certeza do PORQUE ela está lutando. Porém a catarse, o confronto com a humanidade, com si mesmo, não leva a nenhuma glória. Só leva a destruição. E de novo: é muito triste.

O grafismo da violência vai sendo substituído no final da primeira parte por um terror grotesco de formas físicas assustadoras, de body horror, dando conta por si próprio de todo o subtexto de teologia já conhecido na série com Rei agora no centro de tudo isso. É assustador e lindo ao mesmo tempo. Com o vislumbre de como os eventos externos (a violência, o sexo, o ataque, transformações e tal) marcaram de fora a mente de Shinji para que ele chegue no estado que se encontra nos dois últimos episódios da série agora na segunda parte voltamos para dentro. Só que se nos últimos episódios a viagem pela mente de Shinji era para estabelecer um confronto com o seu pior lado aqui a experimentação estética e narrativa revelando uma ligação com o seu lado mais sexual e violento.

O lado de um menino que fazia castelinhos na areia que agora não mais existe mais ou pelo menos foi “amaldiçoado” pela dor. Os diferentes estilos de narrativa, de animação, inserções de live–action, a música feliz como contraste enquanto vemos a barbárie, tudo parece meio que uma resposta ao desejo intrinco de uma humanidade falha e fracassada: o sexo e a violência. E aí então que os personagens recebem as suas fantasias e os seus desejos psicológicos, afetivos, amorosos e sexuais mais ocultos embalados e respondidos novamente com violência.

E aí Shinji mergulha na sua própria mente mais do que nunca: todos os métodos da técnica surrealista são utilizados novamente para falar do sexo, da violência, do que é realidade ou fantasia e até sobre a própria necessidade de “responder” um público. Os conflitos existenciais do final da série continuam, mas aqui de forma bem mais direta, mas sem negar sua ousadia estética e narrativa, pelo contrário, se alimentando dela com muito prazer. E com isso tudo ele consegue complementar a conclusão de Shinji: sua jornada por esperança por alguma perspectiva de um futuro melhor, de “continuar”, de talvez “melhorar” uma nova humanidade e finalmente se relacionar com os outros e o mundo que habita. Um “retorno”. Porém novamente esse “retorno” só responde... Com a violência no final das contas. Se ela se mantém ou não só o futuro dirá. Mas a esperança existe mesmo que por meio dela como resposta. Belo jeito de terminar.

Meio Ferrara, meio Malick, meio Cronnenberg, meio Lynch, meio Buñuel, meio Almodóvar, totalmente Anno. Totalmente Evangelion.

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