"PHOENIX" (CHRISTIAN PETZOLD, 2014) E A HISTÓRIA | CRÍTICA
Crítica escrita por Diego Quaglia.
O cineasta alemão Christian Petzold domina esse
conto sobre o funcionamento do renascimento de uma fênix obrigada a retornar e
marca a sua volta com um fogo que mesmo tão intenso não é capaz de apagar as
dores do passado e os erros do presente. Pelo contrário. Só espalha como um
grande incêndio revelando até onde vai essa fonte de perversidade do pior que a
humanidade tem a oferecer. Petzold se inspirando um romance francês de 1961, dá
uma amostra da sua habilidade de materializar uma sensibilidade extrema ao
observar tão bem questões históricas, políticas e culturais, e as colocando
como um agregador para uma reflexão sensorial do estado emocional dos seus
personagens, daqueles eventos e do próprio cinema.

O diretor vai desenvolvendo esse drama sobre a
perpetuação da destruição do nazismo e do Holocausto pós–Segunda Guerra
Mundial, mas decidi tratar de como essa destruição se mostra não fatal num
nível global, mas num nível muito pessoal e subjetivo, o que só acaba dando um
efeito ainda mais forte para esse mal e do quanto ele é terrível e fatal, e faz
isso construindo um fascinante tom minimalista onde os efeitos do horror e do
que há de pior na pior das situações pode revelar não apenas a dor mas também
traduzir essa dor do que é “macro” no “micro” de maneira tão inteligente e de
um jeito “mínimo” visando uma fusão completa entre o quer mostrar e contar, aí
Christian chega no nível mais extraordinário de se contar uma história, onde
poucas vezes vi se utilizando apenas a pequenez dos olhares, dos gestos e das
poucas palavras de forma certeira em transmitir exatamente o que o filme quer.
O roteiro é pontuado por falas secas, intimistas,
humanas, amargas, inseguras de tão travadas, simbólicas, melancólicas, que
apenas idealizam o ato de expor seus sentimentos e são sempre sutis ao mesmo
tempo tão bonitas quanto duras, ditas por personagens reprimidos, controlados e
presos numa dor imparável e emudecida, e é uma dor que só sabe destruir. A
forma em que Nelly e Jhonny (Ronald Zehrfeld) se reúnem e se relacionam por
meio do silencio que diz tudo que precisa ser dito e desenvolvido sobre eles
dois, faz com que o simbolismo do filme vá para um caminho de hipnose
incendiária mesmo.

Sua personagem é o reflexo de muitas coisas: não
apenas da dor do povo judeu invisibilizado, traumatizado, cheio de cicatrizes,
sem identidade, sem referências e tendo que viver o agora e reconstruir tudo do
zero inclusive o seu passado garantindo as suas heranças e origens de quem são
depois de cruzarem com o mal, mas também carregando o peso de ter a sua vida
marcada, desfigurada e negada pela história. Pelo mal supremo da história. Ao
mesmo tempo na sua relação com o seu marido o filme também fala da culpa que a
Alemanha carrega, a vergonha, a magoa eterno e o peso dela.
Nina Hoss realmente brilha como as chamas de um
incêndio numa interpretação que é a manifestação mais plena do filme todo. Toda
a sua transformação ou revisão pessoal está no seu olhar, no seu silencio, na
sua postura, ela é uma deusa. Seu poder leva a uma cena final tão poderosa, mas
tão poderosa que nem pode ser traduzida com palavras. Seu silencio apenas arde
e continuará ardendo para sempre.
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