TURMA DA MÔNICA: LAÇOS (DANIEL REZENDE, 2019)


Não é de hoje que A Turma da Mônica tem uma história no cinema. Depois de longas de animações, coletâneas de episódios em formato de filme e até filmes com atores fantasiados dos personagens que ninguém lembra, a Turma da Mônica surge as telas como em 2019 com o seu primeiro live action de fato. O mais interessante de tudo isso é se observar como Daniel Rezende junto com a direção de arte de Cassio Amarante e Mariana Falvo além da direção de fotografia de Azul Serra constroem em tela o universo do maior ícone da cultura pop brasileira sabendo dosar e equilibrar o antigo cartunesco que caracteriza a vivência daqueles personagens (seu bairro, suas casas, as mães serem donas de casa, telefones e por ai vai) enquanto mantem elementos atuais (as crianças, as roupas delas, gírias e formas de falar) naquele universo infantil e colorido numa abordagem atemporal dele e não decisiva entre o seu tempo revelando um constate o tempo todo durante o longa entre o contemporâneo e da idealização nostálgica e passada de um universo imaginário e doce.  

Esse abraço do tom estilizado e cartunesco dos quadrinhos e o equilíbrio servindo pra um universo todo e uma gama de personagens entre trazer isso em um formato de carne e osso todos esses fatores lembra não apenas longas brasileiros como os do Menino Maluquinho do Helvécio Ratton e do Fernando Meirelles e da Fabrízia Pinto por exemplo de 1995 e 1998, ou longas como Popeye (1980) de Robert AltmanDick Tracy (1990) de Warren Beatty, os Batman (1989 e 1992) de Tim Burton, os filmes da Família Addams (1991 e 1993) de Barry SonnenfieldOs Flintstones – O Filme (1994) de Brian Levant, Os Batutinhas (1994) de Penelope SpheerisSpeed Racer (2008) das Irmãs Wachowski, entre outros. Porém o filme tenta colocar e dosar isso tudo num cenário realista da emoção que vem do material original e que em sua essência está investindo em narrativas de grupos de aventuras em aventuras lembrando muito "Os Goonies" (1985) de Richard Donner, mas também Conta Comigo (Stand by Me) de Rob Reiner claro, "E.T.: O Extraterrestre" ("E.T.: Extra–Terrestrial", 1982) de Steven Spielberg, "Viagem ao Mundo dos Sonhos" ("Explorers", 1985) de Joe Dante, "Deu a Louca nos Monstros" ("The Monster Squad", 1987) de Fred Dekker e "Se Brincar O Bicho Morde" ("The Sandlot", 1993) de David Mickey Evans. Além de recriações mais recentes desse sub– gênero como Super 8 (2011) de J.J. Abrams, a série "Stranger Things" (2016) dos Irmãos Duffer e a adaptação de "It: A Coisa" (IT, 2017) de Andy Muschietti

Esse desejo em expor o cartunesco as telas em uma espécie de equilibro também resulta em trazer as telas a Mônica (Giulia Benite), Cebolinha (Kevin Vechiatto), Magali (Laura Rauseo) e Cascão (Gabriel Moreira) forma extremamente assertiva. Os atores estão totalmente entregues a essência dos personagens e as suas características mesmo não sendo um bando de cópia e cola das suas versões do quadrinho, além de terem uma química muito natural e graciosa entre si em seus momentos de camaradagem. Todos estão bem em suas particularidades seja Laura com um timing cômico gracioso e um grande carisma, Kevin sendo o melhor em trazer à tona o lado mais dramático de seu personagem sutilmente, Gabriel construindo um Casão encantadora em sua introspecção moleca doce e Giulia dando uma espécie de força palpável e característica para a sua Mônica. Eles fazem um belo quarteto.

E é contando uma aventura da turminha para resgatar Floquinho, o cachorro do Cebolinha, que Turma da Mônica: Laços se revela bem agradável, bonitinho, tem vários momentos fofos, mas ao mesmo tempo parece que o filme não tem o peso emocional dramático desejado em retratar a relação de amizade entre a turminha e os seus dramas internos, algo extraído da grapich novel original de Vitor Cafaggi e Lu Caffagi. Talvez até porque o filme extrai a premissa e a história da grapich novel, porém a inseria num tom muito mais palatável e característico do conhecimento do publico geral sobre a forma dos personagens e do seu cenário. 
Um exemplo é quando um grande momento emocional acontece em que Rezende tenta construir o ápice do conflito entre Mônica e Cebolinha transmitindo uma mensagem sobre “bullying” dolorosa para ambos mas acaba que fica um momento cheio de planejamento emocional, mas vazio na execução por não saber expor essa explosão emocional de uma forma natural e pela montagem agir de forma dispersa durante a cena deixando ela se alongar demais sem força.  

E ao mesmo tempo ele nem consegue transmitir o humor absurdo tão rico deles em brincadeiras de linguagem e sarcasmo. O drama fica na intenção indo para um lado mais clichê moralista da coisa que não chega a incomodar e é o esperando como lições de moral sobre companheirismo, ouvir os seus amigos e enfrentar o medo, tudo isso faz sentido, só errando em que sai desse sair para inserir um drama mais forte. E o humor muda de tom primordial dando o seu foco para algo mais ingênuo e “espertalhão” que qualquer coisa o que funciona bastante. O melhor exemplo disso sendo uma excelente cena envolvendo um cachorro e um coelho servindo de fantoche.

Rezende tem um domínio técnico notável construindo montagens graciosas como a cena em que os personagens dormem e em planos aéreos que faz do seu amplo universo sempre acompanhado da trilha sonora idílica e lúdica de Fábio Góes. O carinho que Rezende e todos da produção tem por esses personagens fazendo desse filme uma verdadeira carta de amor é bem claro enchendo o longa de pequenas referencias com personagens coadjuvantes fazendo pontas, easter eggs sobre a turminha e até aparições surpresas. O mais divulgado desses todos é o Louco de Rodrigo Santoro que surge como uma espécie de filosofo e um arquétipo de conselheiro caindo bem ao tipo mais caricatural do Rodrigo Santoro (contundo a melhor aparição relâmpago é do sempre engraçado como ator Leandro Ramos da TV Quase e do Choque de Cultura). Ao mesmo tempo o filme se descola em traçar uma trama ou desenvolver os personagens para além do mais simplório, mesmo tão despretensioso e tão curto, parece existir um desejo de explorar melhor elementos dessa história e do que ele tem em mãos, mas que não são bem explorados no longa. Até detalhes como o vilão do longa–metragem acabam sendo bastante fracos infelizmente numa presença vazia.

Entre erros e acertos, Turma da Mônica: Laços é um feito. É um feito trazer esses personagens tão icônicos e tão históricos para as telonas de carne e osso e você acreditar que aquelas figurinhas carismáticas são Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão. Torcemos que isso seja o começo para a criação de um universo onde essas histórias imortais da obra de Mauricio de Sousa sejam vistas em filmes e outras obras que as explorem. Aguaremos e vamos torcer. Mesmo imperfeito, Laços foi um primeiro passo... Gracioso.

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